Pulgas: os incríveis saltadores que podem transportar patógenos
Autores
Daniel Antônio Braga Lee, Eliz Oliveira Franco, Gustavo Seron Sanches, Lorena Freitas Neves, Marcos Rogério André
Jovens revisores
Resumo
Você já viu pequenos insetos marrom-escuros pulando dos seus animais de estimação? Talvez essas criaturas fossem pulgas. As pulgas são insetos especializados em se alimentar de sangue, que possuem pernas longas e fortes para pular e garras para se agarrar firmemente ao seu animal de estimação. As pulgas usam muitos animais, incluindo pessoas, como “hotéis” e “restaurantes”. Ainda que os animais de estimação tentem se coçar e se sacudir para expulsar esses hóspedes indesejados, não dá certo! Eles se agarram com suas garras e continuam comendo de graça. Além de desagradáveis, as pulgas podem transmitir doenças aos animais quando se alimentam, ou se, por acidente, o animal as ingerir. Portanto, tome cuidado se esses pequenos insetos decidirem visitar a pele do seu animal de estimação! Quer saber mais? Continue lendo e apresentaremos alguns fatos curiosos sobre a vida das pulgas.
Uma breve história das pulgas
As pulgas são insetos minúsculos e incríveis que vivem entre nós. Embora a história das pulgas seja pouco estudada, existem alguns fósseis conhecidos desses organismos datados de meados da Era Mesozoica, há mais de 66 milhões de anos. A evolução das pulgas é interessante, visto que fósseis do período Jurássico da Era Mesozoica mostram que seus ancestrais eram criaturas de aparência desagradável e, em alguns casos, muito diferentes das pulgas atuais [1]. O fato de poderem estar na Terra desde a época dos dinossauros torna as pulgas insetos fascinantes.
Qual a aparência das pulgas?
Talvez você nunca tenha visto uma pulga de perto, e as perceba apenas como pequenas manchas marrom-escuras saltando do seu animal de estimação. As pulgas são insetos pequenos (1,5 a 3,2 mm de comprimento), marrom-escuros, ovais e com corpos finos e achatados. Elas não voam porque não têm asas, mas estão entre os melhores saltadores do mundo animal [2]. As pulgas têm seis patas longas e o par posterior é extralongo, o que lhes confere uma incrível capacidade de salto. Algumas espécies podem saltar até 200 vezes o comprimento do seu corpo. Em termos práticos, se crianças de 1,5 m de altura tivessem a mesma capacidade de salto de uma pulga, elas poderiam saltar cerca de 300 m no ar, que é a altura da Torre Eiffel!
Sob uma lupa, você pode ver mais detalhes do corpo da pulga (Figura 1). O corpo é dividido em cabeça, tórax e abdômen. A cabeça tem o formato de um capacete, com peças bucais especializadas em perfurar a pele do hospedeiro, permitindo à pulga sugar sangue. As pulgas têm dois olhos que podem detectar luz e um par de antenas. Algumas espécies têm fileiras de espinhos em seus corpos, chamados ctenídios – são espinhos afiados e pontudos dispostos como um pente, permitindo que a pulga se segure em seu hospedeiro enquanto se alimenta.
O corpo de uma pulga é coberto por placas duras e lisas, como uma armadura, e elas têm cerdas nessas placas que apontam todas na mesma direção para se moverem através do pelo do hospedeiro com mais facilidade. Em ambos os lados da pulga, há poros chamados espiráculos (pequenos orifícios que muitos insetos usam para respirar, incluindo pulgas), pelos quais a pulga respira. As pulgas também têm uma estrutura sensorial chamada pigídio, que é uma estrutura sensorial localizada na extremidade posterior das pulgas que as ajuda a sentir o ambiente e que detecta correntes de ar.

Alguns cientistas acreditam que as pulgas podem se comunicar entre si produzindo sons de alta frequência através de seus espiráculos. Esses sons podem ser captados como vibrações pelas cerdas do pigídio de outra pulga. Geralmente, o dorso das pulgas fêmeas é convexo (curvado para fora), enquanto o dorso dos machos é quase reto. As pulgas machos possuem genitais complexos, com o falo (órgão sexual masculino) normalmente enrolado dentro do abdômen [3]. Quando pulgas machos e fêmeas se reproduzem, as células sexuais do macho precisam alcançar as células sexuais da fêmea para produzir óvulos. As fêmeas possuem uma estrutura chamada espermateca, responsável por armazenar as células sexuais depositadas pelo macho.
Nem todas as pulgas são iguais
À primeira vista, todas as pulgas parecem iguais em termos de seu formato e coloração corporal. Mas, se observarmos mais atentamente, podemos ver que algumas têm formas e estruturas diferentes. Organismos que compartilham características comuns e podem procriar juntos são considerados da mesma espécie. Cada espécie recebe um nome científico. Atualmente, mais de 2.500 espécies de pulgas são conhecidas em todo o mundo, a maioria das quais infesta animais, incluindo cães, gatos, coelhos, ratos, raposas, porcos, cabras, guaxinins e algumas aves. Algumas espécies de pulgas chegam a infestar humanos [4].
Onde podemos encontrar as pulgas?
A maioria das espécies de pulgas vive em regiões tropicais, onde o calor e a umidade facilitam seu desenvolvimento. Ao pegarem carona em animais, as pulgas foram transportadas para diversos ambientes e se adaptaram a viver em diversas condições. Você sabia que as pulgas podem viver até mesmo em lugares muito, muito frios, como a Antártica? Embora em geral prefiram climas quentes, existem algumas pulgas super-resistentes que podem infestar aves marinhas e podem ser encontradas nas regiões antártica e subantártica. Em resumo, embora as pulgas sejam mais comuns em áreas com climas mais quentes, elas se estabelecem em quase todos os ambientes da Terra. Portanto, esteja você em uma praia tropical ensolarada, no alto de uma montanha nevada, no meio de uma floresta tropical úmida ou em um deserto, há uma chance de você encontrar esses pequenos insetos irritantes!
O ciclo de vida das pulgas
As pulgas passam por um ciclo de vida que consiste em quatro estágios (Figura 2):

O ciclo de vida completo geralmente leva de 21 a 28 dias.
Ovo
As pulgas fêmeas depositam até 50 ovos por dia em seu hospedeiro. Esses ovos não grudam no hospedeiro e geralmente caem. Isso significa que os ovos das pulgas podem ser encontrados em qualquer lugar dentro de nossas casas (por exemplo, em carpetes, sofás ou roupas de cama) ou em áreas externas (na grama, areia, terra e ninhos). Os ovos das pulgas são minúsculos e difíceis de ver, por isso é quase impossível encontrá-los. Quando as condições de temperatura e umidade são adequadas, os ovos eclodem em poucos dias.
Larvas
Assim que os ovos eclodem, eles se desenvolvem em larvas. As larvas parecem pequenos vermes brancos e realmente não gostam de luz solar, então rastejam para esconderijos escuros e úmidos, onde podem obter sua refeição favorita: matéria orgânica do ambiente. Quando os ovos não caem do animal hospedeiro, as larvas se alimentam das fezes dos pais (eca!) ou de células da pele do hospedeiro.
Pupas
Após cerca de 1 a 2 semanas de alimentação, as larvas iniciam a metamorfose, período em que um animal passa por uma transformação corporal; por exemplo, quando uma lagarta se transforma em borboleta ou quando uma pupa se transforma em adulta. A fase de pupa começa com a metamorfose. Cada larva tece um casulo feito de um material semelhante à seda para se proteger. O casulo é muito pegajoso e ajuda a camuflar a pupa. As pupas podem permanecer nos casulos por várias semanas a meses, pois não precisam se alimentar e podem esperar até que as condições ambientais sejam perfeitas para emergir como adultas.
Adulta
A pulga adulta emerge do casulo quando o clima está quente e potenciais hospedeiros estão por perto. Nesse estágio, as pulgas estão totalmente desenvolvidas e prontas para começar a procurar hospedeiros para se alimentarem de sangue. Tanto as pulgas machos quanto as fêmeas se alimentam de sangue várias vezes por dia. Assim que entram em seu novo lar, reiniciam o ciclo de vida alimentando-se, reproduzindo-se e depositando ovos.
Em geral, as pulgas adultas podem viver de 2 a 3 meses, mas sobrevivem apenas alguns dias ou semanas sem se fixarem em um hospedeiro. O ciclo de vida completo das pulgas-de-gato, por exemplo, geralmente se completa de 21 a 28 dias. O ciclo pode ser influenciado pela umidade, temperatura, quantidade de luz e disponibilidade do hospedeiro. O conhecimento do ciclo de vida das pulgas é essencial para o desenvolvimento de um controle e prevenção eficazes contra pulgas.
As pulgas são perigosas?
As pulgas podem transmitir patógenos (germes muito pequenos que podem deixar humanos e animais doentes), como bactérias nocivas, aos humanos e seus animais de estimação. Elas também podem causar coceira e vermelhidão na pele, o que é chamado de dermatite alérgica.
As pulgas-dos-gatos são responsáveis pela transmissão da bactéria Bartonella henselae aos humanos, que pode causar uma doença chamada doença da arranhadura do gato. Nesse caso, a bactéria é liberada nas fezes das pulgas quando elas se alimentam de sangue de um gato infectado, que geralmente não está doente. Quando o gato infestado por pulgas se coça e se limpa para se livrar das pulgas, as fezes contaminadas penetram em suas garras e em sua boca. O gato pode então transmitir a bactéria aos humanos por meio de mordidas e arranhões [4].
Como você pode ver, as pulgas podem ser um risco à saúde, e a relação próxima entre humanos e animais cria situações em que essas doenças têm maior probabilidade de ocorrer. Além de bactérias, cães e gatos podem ser infectados por parasitas chamados tênias se comerem pulgas infectadas com larvas de tênia [5]. Animais infectados podem ter diarreia e geralmente esfregam o bumbum no chão para mostrar que não estão se sentindo bem.
Proteger a nós mesmos e aos nossos animais de estimação contra pulgas
Controlar a presença de pulgas é essencial para manter os humanos e seus animais de estimação saudáveis e protegidos contra doenças transmitidas por pulgas. Não basta controlar as pulgas apenas nos animais de estimação: pulgas, ovos e larvas também devem ser eliminados do ambiente. Portanto, é importante limpar os espaços internos e externos para remover as pulgas em todas as fases da vida e a matéria orgânica que alimenta as larvas. Os veterinários podem prescrever sprays, sabonetes ou xampus antipulgas, medicamentos orais e coleiras para prevenir a infestação por pulgas [6].
Mensagem final
As pulgas têm características e um ciclo de vida que lhes permite sobreviver no ambiente e em animais. As pulgas adultas que são visíveis nos animais de estimação correspondem a 5% das que existem naquela área. Os 95% restantes estão presentes no ambiente na forma de ovos, larvas e pupas. Quando essas pulgas se tornam adultas, elas procuram hospedeiros para se alimentar. Portanto, para prevenir infestações por pulgas, é importante tratar os animais de estimação e limpar o ambiente onde eles vivem. Quando as pulgas se alimentam de sangue, elas transmitem patógenos para animais e humanos.
Mas não se preocupe! Agora você pode reconhecer pulgas e saber como preveni-las. Certifique-se de informar seus pais se houver qualquer sinal de pulgas em sua casa ou em seus animais de estimação. Se você notar que seu animal de estimação está doente após uma infestação por pulgas, você deve visitar o veterinário para ajudá-lo a se recuperar e prevenir quaisquer problemas.
Glossário
Ctenídio: Espinhos afiados e pontiagudos dispostos em forma de pente, permitindo que a pulga se agarre ao hospedeiro enquanto se alimenta.
Espiráculos: Pequenos orifícios que muitos insetos usam para respirar, incluindo pulgas.
Pigídio: Estrutura sensorial localizada na extremidade posterior das pulgas que as ajuda a sentir o ambiente.
Espermateca: Espécie de depósito onde pulgas fêmeas e outros insetos produzem e armazenam seus ovos.
Espécies: Grupos de seres vivos que se parecem entre si, como cães ou pássaros.
Matéria Orgânica: Qualquer material ou resíduo de organismos vivos ou não vivos.
Metamorfose: Período em que um animal passa por uma transformação corporal; por exemplo, quando uma lagarta se transforma em borboleta ou quando uma pupa se transforma em adulto.
Patógenos: Germes minúsculos que podem causar doenças em humanos ou animais.
Referências
[1] Rasnitsyn, A. P. 1992. Strahshila incredibilis, a new enigmatic mecopteroid insect with possible siphonapteran affinities from the Upper Jurassic of Siberia. Psyche: J. Entomol. 99:323–33. doi: 10.1155/1992/20491
[2] Sutton, G. P., e Burrows, M. 2011. Biomechanics of jumping in the flea. J. Exp. Biol. 214:836–47. doi: 10.1242/jeb.052399
[3] Saari, S., Näreaho, A., e Nikander, S. 2019. Canine Parasites and Parasitic Diseases. Cambridge, MA: Academis Press, 159–85. doi: 10.1016/B978-0-12-814112-0.00008-8
[4] Bitam, I., Dittmar, K., Parola, P., Whiting, M. F., e Raoult, D. 2010. Fleas and flea-borne diseases. Int. J. Infect. Dis. 8:3667–76. doi: 10.1016/j.ijid.2009.11.011
[5] Rousseau, J., Castro, A., Novo, T., e Maia, C. 2022. Dipylidium caninum in the twenty-first century: epidemiological studies and reported cases in companion animals and humans. Parasit. Vectors 15:131. doi: 10.1186/s13071-022-05243-5
[6] Hnilica, K. A. 2011. “Hypersensitivity disorders”, in Small Animal Dermatology: A Color Atlas and Therapeutic Guide, 3rd ed., ed. K. A. Hnilica (Oxford: Elsevier Saunders), 210–212.
Citação
Sanches GS, Neves LF, Lee DAB, Franco EO e André MR (2024) Fleas: Amazing Jumpers That Can Carry Pathogens. Front. Young Minds. 12:1269791. doi: 10.3389/frym.2024.1269791
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