Conheça o BioSentinel, o primeiro experimento biológico conduzido no espaço profundo
Autores
Sergio R. Santa Maria, Sharmila Bhattacharya, Shirin Rahmanian, Tony Slaba, Tore Straume
Jovens revisores
Abyan, Bairon, Ranjai 2, Ranvir 2
Resumo
Em 2022, a NASA lançou um foguete chamado Artemis-I em direção à Lua! O objetivo da missão era testar a segurança do Sistema de Lançamento Espacial para futuras viagens humanas ao espaço profundo. Mas a segurança dos veículos não é a única preocupação dos viajantes espaciais. A radiação espacial é um perigo invisível para os astronautas porque pode prejudicar as células do corpo e, potencialmente, levar a sérios problemas de saúde. Como estudamos os efeitos da radiação espacial nas células? Conheça o BioSentinel! O BioSentinel é um pequeno satélite lançado do Artemis-I que transporta células de levedura e um sensor para medir a radiação espacial. A função do BioSentinel é transmitir para a Terra dados colhidos de células no espaço profundo. Neste artigo, exploraremos a missão do BioSentinel, discutiremos a forma de obtenção e transmissão dos dados, e daremos exemplos de como esses dados ajudarão os cientistas a entender melhor os efeitos da radiação do espaço nos seres vivos.
Você sabia que os cientistas estão enviando organismos vivos para o espaço a fim de estudar como a radiação ali existente afeta as formas de vida [1]? Sim, é verdade! Recentemente, a Administração Nacional para a Aeronáutica e o Espaço (NASA) dos EUA lançou um pequeno satélite, chamado BioSentinel, a partir do foguete Artemis-I. O BioSentinel transportou células de levedura para o espaço, com o objetivo de ajudar os cientistas a aprender mais sobre os efeitos da radiação espacial. Este artigo explorará a missão do BioSentinel e por que ela é importante para as viagens espaciais.
O que é a Missão BioSentinel?
O foguete Artemis-I (Figura 1A) começou sua viagem para a Lua em 16 de novembro de 2022. O objetivo da missão era testar a segurança do Sistema de Lançamento Espacial para futuras viagens humanas ao espaço profundo. A segurança do veículo, no entanto, não é o único risco para os viajantes espaciais. Os astronautas são expostos à radiação enquanto estão no espaço, o que pode levar a sérias consequências para a saúde. Assim, juntamente com os objetivos primários de lançamento do Artemis-I, pequenos satélites também foram acrescentados para testar outros riscos das viagens espaciais, sendo o BioSentinel um deles. O satélite BioSentinel consiste de uma unidade do tamanho de uma caixa de sapatos (Figuras1B, C) que contém células de levedura, componentes eletrônicos e painéis solares necessários para alimentar o satélite no espaço.
A radiação espacial consiste em partículas originadas do Sol e raios cósmicos galáticos vindos de fora do nosso sistema solar. A radiação espacial é formada por partículas de alta energia que viajam pelo espaço com velocidades muito altas e podem passar através de coisas como naves espaciais e trajes espaciais de astronautas [2]. A radiação espacial prejudica seres humanos e outros seres vivos que ficarem expostos a ela por muito tempo, pois danifica o DNA e outras partes importantes da célula.
Danos ao DNA podem levar a sérios problemas de saúde, como o câncer. Na maioria das vezes, as células reparam o dano corretamente; mas, em alguns casos, o dano é muito complexo e elas não conseguem repará-lo. Então, a célula morre ou se reconstitui incorretamente, levando a mutações em seu DNA. As células com mutações começam a se multiplicar incontrolavelmente e é assim que o câncer se forma ao longo do tempo. Muitos dos problemas de saúde causados pela radiação espacial, como o câncer, são efeitos retardados – portanto, os astronautas só ficariam doentes mais tarde, após voltarem à Terra. Ao estudar a radiação espacial, os cientistas esperam aprender mais sobre o modo como ela afeta os seres vivos a fim de descobrir uma maneira de proteger os astronautas.
De que forma o BioSentinel estuda a radiação espacial? O BioSentinel usa células de levedura (Figura 2D) para estudar como os seres vivos respondem à radiação espacial [3].
As células de levedura são organismos unicelulares comumente utilizados para ajudar a massa do pão a crescer ou a cerveja a fermentar. O tipo de levedura armazenado no BioSentinel é utilizado em pesquisas em laboratórios ao redor do mundo. Por sinal, esse foi o primeiro organismo a ter seu DNA completamente sequenciado. As células de levedura são importantes em experiências científicas por suas semelhanças com as células humanas e, portanto, os resultados obtidos a partir delas podem dar pistas sobre nossa saúde. As células de levedura suportam os rigores das viagens espaciais, em especial porque podem ser desidratadas e ativadas por líquido só quando necessário. Também podem ser modificadas para tornar-se mais sensíveis ou mais resistentes à radiação espacial: desse modo, poderemos compreender melhor como as células humanas se comportarão em missões espaciais.
No BioSentinel, as células de levedura ficam em recipientes especiais chamados cartões microfluídicos, onde recebem os nutrientes necessários para permanecer vivas (Figuras 2B, C). Como vimos, a radiação espacial pode danificar o DNA. Ao danificar o DNA da levedura, modifica a atividade metabólicade suas células, que é o modo como elas transformam nutrientes em energia. Um corante especial é aplicado aos cartões microfluídicos, mudando sua cor com base na atividade das células da levedura [1, 3]. O monitoramento da mudança na atividade metabólica permite aos cientistas determinar como a radiação espacial afeta as células de levedura (Figura 3).
Além disso, um sensor de radiação dentro do BioSentinel mede a radiação espacial (Figura 2A). Os dados dos cartões microfluídicos e do sensor são enviados para a Terra, onde os cientistas os analisam para determinar como a radiação provoca danos ao DNA e como as células de levedura reagem a isso.
O que acontecerá depois da missão BioSentinel?
A espaçonave Artemis-I retornou com segurança à Terra, mas o BioSentinel permaneceu no espaço coletando dados. A missão estava prevista inicialmente para durar seis meses e depois foi estendida até novembro de 2024, e neste período os dados do sensor de radiação e dos cartões microfluídicos serão transmitidos periodicamente para a Terra.
Após a conclusão da missão, os cientistas analisarão todos os dados para aprender mais sobre como a radiação espacial afeta os seres vivos. Além disso, os dados serão comparados com experiências na Terra, na Estação Espacial Internacional e, também, com simulações computacionais do ambiente espacial contendo radiação. Esses dados, juntamente com informações de outros estudos espaciais, poderão ser usados para desenvolver novas formas de proteger os astronautas da radiação durante longas missões espaciais – para a Lua, para Marte e mais além! Os dados também poderão ter implicações importantes para a pesquisa do câncer e outras áreas da saúde humana relacionadas com as viagens espaciais.
Conclusão
A missão BioSentinel é um projeto interessante que estuda os efeitos da radiação espacial nos organismos vivos. Ao enviar células de levedura para o espaço profundo, os cientistas esperam aprender mais sobre como a radiação afeta as células e como proteger os astronautas em missões espaciais de longa duração, pois a NASA prepara astronautas para regressarem à Lua e, eventualmente, viajarem para Marte e outros planetas. Os resultados da missão BioSentinel podem ter implicações importantes para a saúde humana e mal podemos esperar para ver o que os cientistas aprenderão com essa missão inovadora.
Glossário
Radiação: Transmissão de energia por meio de ondas ou partículas que se deslocam rapidamente.
Satélite: Objeto que orbita um planeta (gira em torno dele).
Partículas solares: Partículas carregadas de energia liberadas pelo Sol no espaço.
Raios cósmicos galáticos: Partículas de alta energia, de diferentes tipos, que vêm de fora do sistema solar e viajam pelo espaço a grande velocidade.
DNA: Molécula, encontrada no núcleo dos organismos vivos, que contém informações genéticas (genes) e dá aos organismos vivos sua aparência e função.
Mutação: Mudanças, no DNA dos organismos, que induzem as células a funcionar diferentemente.
Cartão microfluídico: Recipiente, no BioSentinel, que fornece fluidos e nutrientes para manter vivas as células de levedura.
Atividade metabólica: Reações químicas nas células que ajudam a converter nutrientes em energia para garantir sua sobrevivência.
Agradecimentos
Esta pesquisa foi apoiada pelo NASA Langley Research Center Cooperative Agreement 80LARC17C0004 e pelo Human Research Program do Space Operations Mission Directorate (SOMP), da NASA. O programa BioSentinel no NASA Ames Research Center (ARC) foi apoiado em parte por NASA Advanced Exploration Systems (AES) Division/Exploration Systems Development Mission Directorate (ESDMD). Os autores agradecem à dra. Kathleen Miller pela ajuda na criação das figuras e pela orientação geral.
Referências
[1] Ricco, A. J., Santa Maria, S. R., Hanel, R. P. e Bhattacharya, S. 2020. “BioSentinel: a 6U nanosatellite for deep-space biological science.” IEEE Aerosp. Electron. Syst. Mag. 35:6–18. DOI: 10.1109/MAES.2019.2953760.
[2] Simonsen, L. C., Slaba, T. C., Guida P. e Rusek, A. 2020. “NASA’s first ground-based Galactic Cosmic Ray Simulator: enabling a new era in space radiobiology research.” PLoS Biol. 18:e3000669. DOI: 10.1371/journal.pbio.3000669.
[3] Santa Maria, S. R., Marina, D. B., Massaro Tieze, S., Liddell, L. C. e Bhattacharya, S. 2020. “BioSentinel: long-term Saccharomyces cerevisiae preservation for a deep space biosensor mission.” Astrobiology 20:1–14. DOI: 10.1089/ast.2019.2073.
Citação
Rahmanian, S., Slaba, T., Straume, T., Bhattacharya, S. e Santa Maria, S. R. (2024). “Meet BioSentinel: the first biological experiment in deep space.” Front. Young Minds. 12:1227860. DOI: 10.3389/frym.2024.1227860.
Este é um artigo de acesso aberto distribuído sob os termos da Creative Commons Attribution License (CC BY). O uso, distribuição ou reprodução em outros fóruns é permitido, desde que o(s) autor(es) original(is) e o(s) proprietário(s) dos direitos autorais sejam creditados e que a publicação original nesta revista seja citada, de acordo com a prática acadêmica aceita. Não é permitido nenhum uso, distribuição ou reprodução que não esteja em conformidade com estes termos.
Encontrou alguma informação errada neste texto?
Entre em contato conosco pelo e-mail:
parajovens@unesp.br