Explorando o minúsculo mundo dos microplásticos em seu próprio “laboratório”
Autores
Aleksandra Tubić, Ivar Zekker, Jordi Colomer, Milica Velimirovic, Stefania Federici, Tereza Serra
Jovens revisores

Resumo
Microplásticos são pequenos pedaços de plástico que resultam da decomposição de objetos plásticos maiores, como garrafas de água, sacolas de compras, recipientes de alimentos e muitos outros tipos de resíduos. Os microplásticos podem ser tão pequenos quanto uma célula bacteriana ou tão grandes quanto um grão de arroz. Os microplásticos existem em muitos formatos diferentes: alguns são redondos e lisos, enquanto outros têm a forma de fibras ou fragmentos. Os cientistas conhecem os microplásticos na natureza desde a década de 1970, mas ultimamente têm encontrado estes pequenos plásticos em quase todos os lugares que olham – no ar, nos lagos, nos rios, nos oceanos, na terra e até em locais remotos como os lagos e a neve do Ártico! Neste artigo, mostraremos o universo oculto dos microplásticos, ferramentas interessantes que os cientistas usam para analisá-los, e mostraremos como você pode fazer seu próprio experimento para analisar os microplásticos de uma praia próxima.
O que são os microplásticos e de onde eles vêm?
Na década de 1950, foi descoberto um novo material superforte e versátil. Este material é conhecido como plástico, e geralmente é feito de combustíveis fósseis. É mais correto dizer “plásticos” porque existem muitos tipos de plástico. Desde a sua descoberta, os plásticos têm sido utilizados em todo o mundo para muitas coisas, como embalagens, garrafas, redes de pesca, construção, equipamentos médicos, pneus e até roupas (Figuras 1A, B).

(B) Exemplos de produtos plásticos contaminando o meio ambiente. (C) Os microplásticos existem em vários formatos (fonte da imagem: fonte própria, com ícones de https://ian.umces.edu/media-library/ e alguns outros de https://www.flaticon.es/).
Os microplásticos vêm principalmente da decomposição de itens de plástico maiores. Eles podem ser tão pequenos quanto 1 micrômetro (invisíveis ao olho humano, o tamanho de uma célula bacteriana) e tão “grandes” quanto 5 milímetros (um pouco menor que um grão de arroz e visível ao olho humano) [1]. Essa quebra acontece com qualquer tipo de resíduo plástico, como garrafas de bebidas, redes de pesca ou balões de aniversário. Além disso, pequenos fragmentos de plástico vêm de pneus de carros e caminhões à medida que se desgastam devido ao atrito com a superfície da estrada.
A chuva transporta essas pequenas partículas de pneus para os rios que se derramam nas águas do oceano. Os microplásticos também vêm de nossas casas. Por exemplo, quando lavamos as nossas roupas, cerca de 700.000 minúsculas microfibras podem escapar e chegar ao oceano através dos rios [2]. Todos esses minúsculos microplásticos provenientes de diversas fontes têm formatos diferentes (Figura 1C), cores diferentes e são feitos de diferentes tipos de materiais plásticos com nomes como poliestireno, polipropileno, polietileno, tereftalato de polietileno e cloreto de polivinila (PVC).
Por que devemos nos preocupar com os microplásticos?
Os microplásticos são uma preocupação global, pois são liberados na natureza e poluem a água, o solo e a atmosfera. A maioria dos microplásticos é transportada para o oceano por inundações, rios e ventos fortes. Os cientistas encontraram microplásticos em muitos lugares, como solos de agricultura, sedimentos oceânicos profundos, lagos árticos e até mesmo na neve. Alguns estudos também relatam que animais, como pássaros, golfinhos e baleias, também comem microplásticos acidentalmente [3].
Entender a abundância dos microplásticos na natureza é importante para descobrir o quão prejudiciais esses minúsculos plásticos são para nós. Os microplásticos podem possuir vários efeitos no corpo humano. Estas pequenas partículas podem entrar na corrente sanguínea, com alguns estudos sugerindo que podem aumentar o risco de doenças cardíacas [4]. Além disso, certos produtos químicos associados aos microplásticos, como o bisfenol A e os ftalatos, podem interagir com os nossos hormônios. Essa interação pode influenciar fatores como regulação do peso e saúde geral [5].
Ferramentas interessantes para encontrar e estudar microplásticos
Não é fácil detectar microplásticos na natureza, especialmente os realmente minúsculos, porque não são visíveis aos olhos. Para isso, os cientistas são como detetives. Eles usam várias ferramentas para extrair microplásticos da água, do ar e do solo para estudá-los mais detalhadamente [6].
A microscopia ajuda a visualizar, identificar e medir pequenos microplásticos, especialmente por meio de um microscópio poderoso chamado microscópio eletrônico. Quando colocados sob diferentes tipos de microscópio, os microplásticos são impregnados com um corante chamado vermelho do nilo, que facilita sua vizualização. A espectroscopia detecta diferentes microplásticos ao analisar a luz que eles refletem, o que ajuda a identificar cada tipo de plástico por sua “impressão digital” de luz.
A análise química também pode ser usada para identificar os compostos químicos dos quais cada tipo de microplástico é feito. Para fazer isso, os microplásticos são aquecidos num forno e divididos em compostos menores. Os componentes passam por um tubo especial em velocidades diferentes e, ao final, outra ferramenta científica tira uma “foto” de cada componente para descobrir do que ele é feito. O nome dessa técnica é cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de massas por pirólise.
A análise por meio de qualquer uma dessas ferramentas interessantes em geral é repetida várias vezes, para verificar se os resultados são confiáveis. Os cientistas também usam vários métodos para verificar suas descobertas, garantindo que obtenham as melhores informações possíveis.
Hora de Aventura: Detectando Microplásticos na Praia
Se você quer ser um detetive ambiental e coletar seus próprios dados sobre microplásticos na praia, você pode! Basta seguir este procedimento simples [6].
Para a coleta das amostras, serão necessários os seguintes materiais (Figura 2A):

• Uma régua de 50 cm
• Uma espátula ou colher de metal
• Um recipiente de vidro ou metal
Vá para a praia e siga estes passos:
1. Marque um quadrado de 50 × 50 cm na areia com a espátula.
2. Raspe a área marcada com a espátula, até uma profundidade de aproximadamente 1 cm.
3. Recolha toda a areia e, com a espátula ou colher, coloque-a no recipiente de vidro ou metal.
Ao coletar amostras, evite usar ferramentas plásticas. Em vez disso, opte por recipientes de vidro ou metal. Use roupas de algodão durante o processo de coleta e análise.
Para a análise em seu “laboratório” você precisará do seguinte material (Figura 2B):
• O recipiente com a amostra que você coletou
• Uma balança
• Uma garrafa de vidro com um litro de água
• 400 g de sal
• Uma peneira de metal com a malha mais fina possível (como a da sua cozinha). Se puder, tente medir o tamanho dos buracos na sua peneira (provavelmente alguns milímetros, mais ou menos)
• Um smartphone ou câmera para tirar fotos
• Um filtro de papel caseiro que você pode fazer cortando um círculo de um pedaço de papel
Aqui estão as etapas a seguir para analisar os microplásticos em sua amostra:
1. Deixe a areia secar por 2–3 dias, até que esteja completamente seca. Se a amostra contiver alguns galhos ou folhas de plantas, retire-os com a colher, com muito cuidado. Pese a amostra e anote o resultado em gramas.
• Utilizando a peneira metálica, separe a amostra em duas partes (menor e maior que a malha da sua peneira). Você analisará apenas as partículas grandes. Para analisar os pequenos, você precisaria de um microscópio.
2. Misture 400 g de sal em 1 L de água. Misture vigorosamente, agitando a garrafa ou mexendo com uma colher de metal. Se houver uma tampa na garrafa, certifique-se de que seja de metal e não de plástico. Se for de plástico, coloque papel alumínio entre a tampa e o frasco.
• Após misturar, coloque a amostra na garrafa de água salgada.
• Misture novamente vigorosamente e deixe esta mistura por 24 h. No dia seguinte, despeje com muito cuidado a parte superior da água (cerca de 5 cm) pela mesma peneira novamente, desta vez com o filtro de papel posicionado dentro da peneira.
• Deixe o papel filtro secar por mais 24 horas. Você pode usar uma lupa para inspecionar o que há no filtro de papel ou usar seu smartphone para tirar uma fotografia da amostra. Se quiser ser muito preciso, você pode tirar uma foto do filtro de papel antes de filtrar a amostra de água. Isso o ajudará a detectar o que veio da amostra que você filtrou versus o que pode ter ficado preso no papel do filtro antes de começar.
3. Conte o número de partículas obtidas. Muitas delas serão partículas de plástico (Figura 2C).
Agora você pode fazer alguns cálculos científicos:
Para descobrir a quantidade de poluição por microplásticos na sua amostra, divida o número de partículas de plástico obtidas pelo peso da amostra que você anotou no início. Isso lhe dará o número de partículas de microplástico por grama de areia. Agora você pode comparar os resultados para diferentes areias e determinar qual amostra tem o maior número de MPs.
Qualquer tipo de trabalho de laboratório como este requer um espaço de trabalho organizado e limpo. Ao estudar microplásticos, você nunca deve usar materiais plásticos porque eles podem adicionar plástico à sua amostra. Portanto, devem ser usadas roupas de algodão e luvas de látex. Todos os materiais devem ser de vidro ou metal.
As peças que faltam no quebra-cabeça dos microplásticos
Embora os cientistas tenham feito descobertas surpreendentes, ainda faltam muitas peças no quebra-cabeça dos microplásticos.
Imagine tentar resolver um quebra-cabeça com peças de formatos diferentes que não se encaixam perfeitamente. É um pouco como os cientistas enfrentam desafios com diferentes formas de medir microplásticos. Precisamos de regras ou ferramentas comuns que todos possam usar. Dessa forma, todos podemos compreender e comparar melhor as descobertas. Cientistas de todo o mundo, incluindo o nosso grupo de investigadores, estão se unindo através de redes de investigação colaborativa denominadas Cooperações de Ciência e Tecnologia (COST, na sigla em inglês). Estes grupos reúnem especialistas de diferentes países para trabalhar em desafios específicos, como a compreensão dos microplásticos! Ao partilhar dados e ideias, estas colaborações sobre vários tópicos (Figura 3) potencializam os nossos esforços na resolução do quebra-cabeças dos microplásticos [7].

Lembre-se, cada pequena ação conta – seja reduzindo o uso de plástico e reciclando adequadamente, apoiando regras que incentivam materiais ecologicamente corretos, melhorando filtros em máquinas de lavar e estações de tratamento de águas residuais, compartilhando conhecimento ou desencadeando conversas sobre a proteção do nosso planeta. Ao fazermos tudo isto em conjunto, podemos progredir na resolução do problema dos microplásticos e ajudar a manter o nosso planeta limpo. Além de usar menos produtos plásticos e descartá-los adequadamente, uma das coisas mais importantes que você pode fazer é continuar explorando e fazendo perguntas!
Glossário
Microplásticos: Pequenos pedaços de plástico que variam de 1 micrômetro a 5 mm (ou 5.000 micrômetros) de tamanho. Eles vêm principalmente da quebra de itens de plástico maiores.
Microscopia: Técnica científica usada para ver objetos que não podem ser vistos a olho nu.
Microscópio Eletrônico: Um instrumento que usa um feixe de elétrons para ampliar a imagem de objetos que não podem ser vistos a olho nu.
Espectroscopia: Método científico usado para descobrir de que materiais os objetos são feitos, pela forma como absorvem e refletem a luz. Cada substância possui uma “impressão digital” de luz única.
Análise Química: Processo que separa, identifica e quantifica substâncias em diferentes amostras.
Cromatografia gasosa acoplada à espectrometria de massas por pirólise: Técnica científica utilizada para estudar materiais complexos, nos quais eles são aquecidos até se decomporem em seus componentes, que são então separados e identificados.
Referências
[1] Rist, S., Hartmann, N. B., e Welden, N. A. C. 2021. How fast, how far: Diversification and adoption of novel methods in aquatic microplastic monitoring. Environ. Pollut. 291:118174. doi: 10.1016/j.envpol.2021.118174
[2] Napper, I. E., e Thompson, R. C. 2016. Release of synthetic microplastic plastic fibres from domestic washing machines: effects of fabric type and washing conditions. Mar. Pollut. Bull. 112:39–45. doi: 10.1016/j.marpolbul.2016.09.025
[3] Merrill, G. B., Hermabessiere, L., Rochman, C. M., e Nowacek, D. P. 2023. Nowacek, Microplastics in marine mammal blubber, melon, & other tissues: evidence of translocation. Environ. Pollut. 335:122252. doi: 10.1016/j.envpol.2023.122252
[4] Marfella, R., Prattichizzo, F., Sardu, C., Fulgenzi, G., Graciotti, L., Spadoni, T., et al. 2024. Microplastics and nanoplastics in atheromas and cardiovascular events. N. Engl. J. Med. 390:900–10. doi: 10.1056/NEJMoa2309822
[5] Li, P., and Liu, J. 2024. Micro(nano)plastics in the human body: sources, occurrences, fates, and health risks. Environ. Sci. Technol. 58:3065–307. doi: 10.1021/acs.est.3c08902
[6] Rani, M., Ducoli, S., Depero, L. E., Prica, M., Tubić, A., Ademovic, Z., et al. 2023. A complete guide to extraction methods of microplastics from complex environmental matrices. Molecules 28:5710. doi: 10.3390/molecules28155710
[7] Federici, S., Ademovic, Z., Amorim, M. J. B., Bigalke, M., Cocca, M., Depero, L. E., et al. 2022. COST Action PRIORITY: an EU perspective on micro- and nanoplastics as global issues. Microplastics 1:282–90. doi: 10.3390/microplastics1020020
Citação
Serra T, Colomer J, Zekker I, Gündoğdu S, Hartmann NB, Federici S, Tubić A e Velimirovic M (2024) Exploring the Tiny World of Microplastics in Your Own “Lab”. Front. Young Minds. 12:1390723. doi: 10.3389/frym.2024.1390723
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