O que o tinitus tem a ver com a perda de audição?
Autores
Giriraj Singh Shekhawat, Winfriend Schlee
Jovens revisores
Resumo
Os órgãos dos sentidos, juntamente com o cérebro, nos propiciam uma compreensão detalhada do mundo à nossa volta. Se algo der errado com qualquer um dos órgãos dos sentidos, nosso funcionamento diário não será o mesmo. Um exemplo é a perda de audição e o tinitus, ou zumbido. A perda de audição é definida como a perda de informação auditiva (som) devido a danos no sistema auditivo.
O tinitus é um som que as pessoas ouvem mesmo que não exista nada no ambiente ao redor emitindo-o. Esse fenômeno pode acontecer como resultado de perda auditiva. As pessoas descrevem o tinitus como um som de rangido, chiado ou assobio, mas não há nenhum objeto por perto que esteja gerando esse som. Neste artigo, descrevemos algumas estratégias que podem ser usadas para poupar nossa audição, tais como afastar-se da fonte sonora, proteger os ouvidos e reduzir os níveis de volume dos aparelhos produtores de som. Ainda não há cura para o tinitus. Também discutimos maneiras de enfrentar o zumbido, como aprender a tolerá-lo, relaxar, desviar dele a atenção e procurar a ajuda de um médico.
Como experimentamos o mundo ao nosso redor?
Nossos órgãos dos sentidos (olhos, ouvidos, língua, nariz e pele) são extremamente valiosos por nos proporcionarem uma imagem detalhada do mundo que nos cerca. Como exemplo, imagine que você tem uma maçã em sua mão. Você pode tocá-la e sentir sua forma, pode vê-la com seus olhos e dizer sua cor, pode mordê-la e ouvir o ruído da mastigação, degustar seu doce sabor com a língua e cheirá-la. Nossos órgãos dos sentidos enviam todas essas informações para o cérebro, que em seguida nos proporciona uma experiência completa da maçã.
Cada um dos órgãos sensoriais é valioso para nossa vida cotidiana e nosso poderoso cérebro é o centro de tudo. O cérebro combina toda essa informação sensorial para que possamos ter uma experiência completa do mundo.
E se um dos órgãos dos sentidos for danificado?
Imagine o que acontecerá se um desses órgãos dos sentidos for danificado. Seríamos capazes de desfrutar de toda a experiência do mundo ao nosso redor? Provavelmente não, porque nosso cérebro estaria perdendo as informações importantes desse órgão dos sentidos. Explicaremos isso em detalhe usando os ouvidos como exemplo. Se nossos ouvidos forem danificados e não mais ouvirmos bem, duas serão as consequências. Em primeiro lugar, o cérebro perderá a informação dos ouvidos: haverá “perda de audição”. Em segundo lugar, o cérebro tentará preencher a lacuna criada pela perda auditiva. Como resultado, uma pessoa com perda auditiva começará a ouvir um som que outras pessoas não estão ouvindo. Esse som é chamado de “tinitus”. Trataremos neste artigo, pormenorizadamente, tanto da “perda de audição” quanto do “tinitus”.
Perda de audição
A audição é valiosa por obtermos informações sobre nosso ambiente e para nos comunicarmos bem com as pessoas ao nosso redor. Podemos ouvir música ou as vozes de nossos entes queridos, o que nos deixa felizes e gera emoções positivas. A audição também desempenha um papel importante para nos proteger do perigo. Por exemplo, observe o menino brincando com uma bola na parte superior da Figura 1. Um carro está se aproximando dele por trás. Mesmo sem vê-lo, o menino reconhece instantaneamente o som do carro, sabe de onde vem e tem a chance de sair do caminho.
A parte inferior da Figura 1 explica como nossa audição funciona. O som viaja da parte externa da orelha, que é chamada de pavilhão auricular, até o canal auditivo. Esses dois componentes são chamados de ouvido externo. O som, então, faz vibrar o tímpano, que por sua vez coloca os ossículos (um conjunto de três pequenos ossos no ouvido médio) em movimento. O movimento dos ossículos cria ondas no fluido da cóclea, que tem a forma de caracol.
A cóclea está localizada bem no fundo, em uma área chamada ouvido interno. É na cóclea que a energia sonora se converte em impulsos elétricos pela ação de milhares de minúsculas células ciliadas. O nervo auditivo passa essa informação para o cérebro, onde as características do som – tonalidade, altura e direção – são então compreendidos, de modo que o menino reconheça o som do motor como um carro se aproximando por trás dele. Esse é um processo rápido, que acontece em menos de um segundo. A rapidez do processo auditivo permite ao menino reagir quase instantaneamente.
Nosso sistema auditivo, sobretudo as células ciliadas do ouvido interno, é muito sensível e pode ser facilmente danificado por sons altos. Se essas células ciliadas forem danificadas, o dano será permanente. Exemplos de sons altos: obras de construção, barulho de tráfego, ruído de motor de avião e outros. Entretanto, os sons também podem ser agradáveis, como uma TV em volume muito alto, a música “pesada” de um show de rock ou som oriundo de i-pods, mp3 players, rádios ou outros dispositivos de música. É extremamente importante proteger nossos ouvidos desses ruídos altos, pois eles podem danificar permanentemente nossa audição.
Como você pode proteger seus ouvidos?
Você pode usar as três estratégias seguintes para proteger seus ouvidos [1]. Elas são mostradas na Figura 2.
Estratégia 1: Afaste-se da fonte do som
Sempre que possível, você deve se afastar dos sons altos. Por exemplo, quando passar perto de uma obra de construção barulhenta, distancie-se rapidamente do local. Para dar outro exemplo, imagine-se em um auditório ao lado de um alto-falante com o som muito alto. Você pode optar por afastar-se dali. Afastar-se da fonte de som reduz o impacto dos sons altos em seus ouvidos e minimiza as chances de danos à sua audição.
Estratégia 2: Proteja seus ouvidos
Em algumas situações, não é possível afastar-se da fonte de som, mas mesmo assim você poderá poupar seus ouvidos com protetores auriculares. É o que muitas pessoas fazem quando precisam trabalhar em ambientes barulhentos – elas carregam um dispositivo profissional de proteção auricular e o usam quando há sons altos. Se você não tem um dispositivo de proteção auricular, pode simplesmente tapar os ouvidos com as mãos. Melhor ainda, pode colocar os dedos indicadores nos canais auditivos para impedir que o som entre no ouvido.
Estratégia 3: Abaixe o volume
Quando você estiver escutando música ou vendo TV, preste atenção ao nível do som. Se escutar música alta ou assistir TV com som alto por um longo tempo, poderá sofrer um dano permanente em seus ouvidos. Às vezes, videogames e brinquedos eletrônicos vêm com níveis de som altos e não possuem um botão para abaixá-los. Nesse caso, você pode cobrir o alto-falante com várias camadas de tecido para absorver o som e diminuir o volume.
Todas essas estratégias podem ajudá-lo a prevenir danos ao ouvido e preservar sua audição. Se você prestar atenção aos músicos profissionais, notará que muitos usam protetores auriculares enquanto se apresentam no palco porque querem proteger sua preciosa audição, o que é extremamente importante para um bom músico.
Tinitus
O tinitus é um sintoma que pode se desenvolver como resultado da perda auditiva. Se você tiver tinitus, ouvirá um som, mas não haverá nenhum objeto ao seu redor que esteja criando esse som. O tinitus acontece porque o cérebro está tentando compensar a falta de informações do ouvido por causa da perda auditiva.
O tinitus é uma condição muito comum, que afeta milhões de pessoas em todo o mundo [2]. Na maioria das vezes, as pessoas com tinitus o descrevem como rangido, chiado ou assobio. É muito provável que você mesmo já tenha escutado um som de zumbido durante um período muito curto de tempo, por exemplo, depois de assistir a um show barulhento ou da exposição a um ruído alto súbito, como o das batidas fortes de um martelo. Se você tiver esse breve zumbido, não se preocupe – na maioria das pessoas, ele desaparecerá por si só. Mas, em algumas pessoas, o zumbido não desaparece e elas o ouvem constantemente, o que irrita. Algumas pessoas se incomodam tanto com o zumbido que têm dificuldade para adormecer, se concentrar ou não conseguem acompanhar bem uma conversa porque ele está ali o tempo todo. Algumas até se sentem ansiosas ou deprimidas, o que pode afetar sua qualidade de vida.
O que os pesquisadores pensam sobre o Tinitus?
Tinitus significa a escuta de um som que não existe, logo é fácil supor que seja um problema no ouvido. Há muitos anos, os pesquisadores pensavam assim. Mas, nas últimas décadas, muitos estudaram imagens que registram a atividade de diferentes áreas do cérebro e perceberam que o tinitus não é um problema apenas do ouvido, e que várias áreas do cérebro são responsáveis por ele [3]. Cientistas de todo o mundo trabalham para expandir nossa compreensão sobre o zumbido, e o conhecimento cresce a cada ano. Esses cientistas se reúnem em conferências e seminários (por exemplo, Tinnitus Research Initiative, International Tinnitus Seminar e TINNET) para discutir as descobertas mais recentes na área do zumbido. Existem várias clínicas especializadas dedicadas a ajudar pessoas com zumbido e várias formas de amenizar o problema, desenvolvidas para pessoas que sofrem dessa condição.
O que pode ser feito para amenizar o Tinitus?
Por enquanto, não há cura para o Tinitus, mas existem várias maneiras de controlá-lo ou reduzi-lo parcialmente [4, 5]. Aqui estão algumas dicas úteis para isso. Procure compartilhar algumas delas com pessoas que você conhece e que têm Tinitus.
- Conheça o seu tinitus – é importante entender o tinitus, suas causas e o que pode ser feito para controlá-lo. Essa informação é valiosa para enfrentar o problema e corrigir as crenças erradas associadas a ele. Vale dizer que o tinitus não é um sinal de perigo, é um som inofensivo e não há por que ter medo dele.
- Relaxamento e distração – algumas pessoas com tinitus percebem que ele diminui quando estão relaxadas, por isso é bom reduzir o estresse. Isso pode ser alcançado mediante o emprego de técnicas de relaxamento, como respiração profunda, caminhada, esportes, atividades agradáveis ou outras que promovam descontração. Algumas pessoas também se beneficiam ao desviar sua atenção para longe do tinitus, fazendo coisas como ouvir música suave ou realizar uma tarefa interessante. Não prestar atenção ao tinitus pode torná-lo menos incômodo.
- Procure ajuda profissional – além da perda auditiva descrita neste artigo, pode haver várias outras causas de tinitus. Alguns médicos profissionais são treinados para ajudar as pessoas com esse problema: especialistas em garganta/nariz/ouvido, audiologistas (especialistas em audição), neurologistas (especialistas em cérebro), psicólogos e terapeutas físicos. Eles podem oferecer várias opções de tratamento com base nos detalhes do zumbido e nos outros sintomas que o paciente possa apresentar.
Exemplos dessas opções de controle são aparelhos auditivos, dispositivos chamados “máscaras” que “encobrem” o som do tinitus, aconselhamento para o paciente aprender a lidar com o problema e estimulação cerebral – para citar apenas alguns. É importante lembrar também que cada paciente é único e cada qual responde diferentemente aos tipos de tratamento oferecido. Portanto, é extremamente importante buscar ajuda profissional. Os especialistas em tinitus podem ajudar a encontrar os melhores tratamentos para reduzir o problema.
Glossário
Perda auditiva: Dano ao ouvido que resulta em perda de capacidade auditiva.
Zumbido: Percepção de um som que ninguém mais ouve.
Cóclea: Órgão no ouvido interno que converte o som em impulsos elétricos.
Nervo auditivo: Nervo que envia sinais auditivos dos ouvidos para o cérebro.
Audiologistas: Especialistas em audição que tratam de pacientes com perda auditiva, prescrevem aparelhos de surdez e controlam o problema.
Referências
[1] Martin, W. H. 2008. “Dangerous decibels: partnership for preventing noise-induced hearing loss and tinnitus in children.” Seminars in Hearing. Stuttgart: Thieme Medical Publishers.
[2] Shargorodsky, J., Curhan, G. C. e Farwell, W. R. 2010. “Prevalence and characteristics of tinnitus among US adults.” Am. J. Med. 123:711–718. DOI: 10.1016/j.amjmed.2010.02.015.
[3] De Ridder, D., Elgoyhen, A. B., Romo, R. e Langguth, B. 2011. “Phantom percepts: tinnitus and pain as persisting aversive memory networks.” Proc. Natl. Acad. Sci. U.S.A. 108:8075–8080. DOI: 10.1073/pnas.1018466108.
[4] Langguth, B., Kreuzer, P. M., Kleinjung, T. e De Ridder, D. 2013. “Tinnitus: causes and clinical management.” Lancet Neurol. 12:920–930. DOI: 10.1016/S1474-4422(13)70160-1.
[5] Baracca, G., Del Bo, L. e Ambrosetti, U. 2011. “Tinnitus and hearing loss”, em Møller, A. R., Langguth, B., De Ridder, D., Kleinjung, T., orgs. “Textbook of Tinnitus.” New York: Springer, pp. 285–291.
Citação
Schlee, W. e Shekhawat, G. (2017). “What does tinnitus have to do with hearing loss?” Front. Young Minds. 5:2. DOI: 10.3389/frym.2017.00002.
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