Dinossauros 25 de maio de 2022, 11:42 25/05/2022

O Tyrannosaurus rex era um predador feroz ou um fracote?

Autores

Jovens revisores

Ilustração de um Tyrannosaurus rex sentado à mesa lendo um jornal e tomando café. A manchete do jornal é:

Resumo

O Tyrannosaurus rex é o dinossauro mais famoso do mundo, amado pelos paleontólogos e pelo público (especialmente as crianças). O estilo de vida que ele seguia é um dos tópicos mais apaixonadamente discutidos na área da pesquisa de dinossauros. O T. rex foi o maior predador de seu ecossistema, pois era dotado de uma mordida poderosa – e que talvez fosse venenosa. Mas já foi sugerido que ele não passava de um necrófago (isto é, comedor da carne de animais mortos), e seria não um predador ativo, mas o equivalente sáurio de um urubu. O objetivo deste artigo é examinar o comportamento e o estilo de vida desses incríveis animais para dar ao leitor pistas sobre se o T. rex era ou não um predador.

O Tyrannosaurus rex é o mais famoso e o mais querido dinossauro do planeta. O gênero Tyrannosaurus contém apenas uma espécie, a T. rex. Esse nome significa, muito apropriadamente, “rei lagarto tirano”. O primeiro esqueleto de um T. rex foi desenterrado por Barnum Brown em 1900, sendo descrito e nomeado por Henry Fairfield Osborn cinco anos mais tarde [1]. O T. rex foi o maior predador da América do Norte no Cretáceo superior, o último período em que viveram os dinossauros (não incluídas as aves), entre 68 e 66 milhões de anos atrás. Muito do que sabemos do T. rex vem do meio-oeste americano. Ele era um terópode (o grupo dos dinossauros predominantemente carnívoros) que chegava a 12 m de comprimento e talvez pesasse até 8 t, ou seja, muito mais do que o elefante africano!

Uma cabeça gigante e uma mordida daquelas!

A característica mais notável do tiranossauro é sua cabeça enorme, que pode medir até 1,52 m (Figura 1). Ao que parece, sua mordida era mais forte que a de qualquer outro animal terrestre que já existiu. Simulações de computador baseadas na forma e na força da cabeça do T. rex mostraram que essa mordida era mesmo incrivelmente poderosa. Para você ter uma ideia, era até 114 vezes mais forte que a da maioria dos humanos [2].

Figura 1. Desenho do crânio de um T. rex em comparação com o de um humano.

Ao contrário dos dentes finos e em forma de lâmina da maioria dos terópodes (que incluem o Allosaurus, o Velociraptor e até pássaros), os dos tiranossaurídeos eram ovais e com corte transversal. O grosso corte transversal dos dentes dos tiranossaurídeos mostra que eram muito fortes, o que é confirmado por um coprólito (fezes fossilizadas) de 20 cm encontrado no Canadá, misturado com fragmentos de ossos. Os largos dentes dos tiranossaurídeos davam suporte estrutural para aguentar as tensões associadas ao ato de subjugar presas que resistissem.

Pensou-se que o tiranossauro tivesse mordida séptica. A forma e o ângulo dos espaços entre os dentes lembram de perto os do dragão de Komodo, uma espécie conhecida por suas mordidas sépticas. Gordura e outras partículas de alimento ficam presas nos interstícios dos dentes e levam à formação de colônias de bactérias infecciosas, de modo que uma mordida não letal de um tiranossauro poderia provocar uma séria infecção bacteriana [3]. Entretanto, o serrilhado dos dentes é semelhante ao que é encontrado em outros terópodes, não se podendo, portanto, afirmar que o tiranossauro fosse diferente nesse aspecto. Além disso, como caçasse presas bem menores que ele, uma mordida séptica não aumentaria muito sua eficiência como predador.

Os sentidos do T. rex

O T. rex tinha um olfato espantoso. Sabemos disso porque as partes do cérebro responsáveis por esse sentido (os bulbos olfativos) eram maiores que as de outros terópodes, sugerindo que esse era um fator comportamentalmente importante para o tiranossauro [4]. Ele conseguia localizar a presa a grandes distâncias, um verdadeiro urubu do Cretáceo.

Os olhos eram grandes para um terópode de seu tamanho. Escaneamentos de tomografia computadorizada de cérebros e crânios fossilizados – um processo que cria milhares de imagens sequenciais em raios-X do material examinado – mostram que o nervo ótico, que leva informações dos olhos para o cérebro, era muito desenvolvido. Além disso, os olhos do tiranossauro eram dirigidos para a frente, o que lhe proporcionava percepção de profundidade. Ele podia, assim, medir distâncias, uma adaptação comum aos modernos caçadores. O tamanho e a posição dos olhos, bem como a estrutura do cérebro, levaram os cientistas a pensar que o T. rex tinha uma visão tão boa quanto a das aves de rapina atuais [4].

Os poderosos bracinhos do T. rex

Os braços do T. rex eram relativamente pequenos, mais ou menos do tamanho dos braços humanos, embora com proporções diferentes e apenas dois dedos (Figura 2). Discute-se muito sobre as possíveis funções de seus membros dianteiros. Mas, longe de ser inúteis, eles eram musculosos e, a julgar pelo volume de seus bíceps, capazes de erguer até 180 kg (embora essa seja a estimativa máxima). Portanto, esses braços deviam servir a um propósito qualquer, que ainda é debatido entre paleontólogos [5]. Os braços deles eram menores, e dotados de garras menos aguçadas, do que os que possuíram seus ancestrais; portanto, qualquer que fosse a forma como usassem seus braços, não os empregavam tão bem quanto seus antepassados.

Figura 2. Diagrama de um braço do T. rex mostrando seus ossos (à esquerda) e como ele devia parecer quando o animal estava vivo (direita).

Crescimento

Os dinossauros também mudavam quando envelheciam, como acontece conosco. Ao contrário dos adultos de cabeças enormes e grande porte, os T. rex jovens eram diferentes: menores, cabeças mais estreitas, pernas longas e finas, e dentes mais parecidos com lâminas. Assim, os paleontólogos concluíram que os tiranossauros jovens não viviam como os adultos. Os membros mais compridos e os corpos mais delgados indicam que podiam correr mais rápido, enquanto suas cabeças menores e seus dentes em forma de lâminas revelam que não esmagavam ossos como os adultos.

“Guerreiro” ou “fracote”

A visão clássica do T. rex é que se tratava de um terrível predador e dizer o contrário pareceria até uma heresia. Em 1994, o paleontólogo americano Jack Horner publicou um artigo sugerindo que essa visão, dominante durante cem anos, deveria ser virada de cabeça para baixo… T. rex, o Rei Lagarto Tirano, era um comedor de carniça… A teoria de que ele e seus parentes próximos eram necrófagos se baseia na forma dos dentes, no sentido do olfato e no tamanho dos braços [6]. Muitos desses pontos já foram discutidos neste artigo. E o que você pensa? O T. rex era um carniceiro ou um predador?

A melhor resposta é: assim como a maioria dos carnívoros vivos, ele era… as duas coisas! Há bons exemplos, no registro fóssil, de grandes tiranossauros agindo como necrófagos [7], mas há também sólida evidência de que eles caçavam ou pelo menos tentavam caçar.

Os paleontólogos encontraram vários exemplos de tentativas fracassadas de predação, nas quais os tiranossauros deixaram marcas ou até dentes em suas presas. Um desses casos é o de um hadrossauro de bico de pato – um dinossauro herbívoro chamado Edmontosaurus annectens, muito comum no período Cretáceo – com uma marca de mordida que removeu parte de sua cauda (Figura 3). O osso se regenerou em volta da marca do dente, mostrando que o animal sobreviveu ao ataque do T. rex [8]. Outros casos de predação fracassada incluem uma vértebra de hidrossauro encontrada na Hell Creek Formation, no Estado de Dakota do Sul, EUA, com um dente de tiranossauro preservado dentro do osso, que se regenerou e o envolveu [9].

Figura 3. Na cauda desse dinossauro, Edmontosaurus annectens, há uma clara evidência de predação. Como se pode ver, uma das espinhas neurais foi mordida e as duas à sua esquerda apresentam dois buracos feitos pelo dente de um tiranossauro, assinalados pelas setas amarelas. CC BY-AS 3.0.

Conclusão

O T. rex foi o maior predador da América do Norte durante os últimos dois milhões de anos da era dos dinossauros. Analisando os resquícios fósseis do T. rex, os paleontólogos descobriram muita coisa a respeito do comportamento desses animais incríveis. Após um exame de seus crânios, podemos constatar que eles tinham uma mordida mais forte que a de qualquer animal terrestre já surgido no mundo. Embora o T. rex fosse um predador ativo, ele praticava também a necrofagia quando era preciso, como a maioria dos outros grandes predadores.

Glossário

Predador: Animal carnívoro que mata suas presas.

Cretáceo: Último período da Era Mesozoica (que inclui também os períodos Triássico e Jurássico), que durou de 145 milhões a 66 milhões de anos atrás.

Tiranossaurídeos: Grupo de dinossauros gigantes e carnívoros que viveram na América do Norte e Ásia durante a última parte do Cretáceo. Inclui o Tyrannosaurus e seus parentes próximos, como o Albertosaurus e o Tarbosaurus asiático.

Mordida séptica: Ocorre quando uma mordida faz com que bactérias se transfiram da boca para a ferida, levando a uma infecção bacteriana e até ao envenenamento do sangue – condição chamada sepse.

Necrófago: Animal carnívoro que procura e come animais já mortos.

Agradecimentos

Agradecemos a Pedro Morais (Universidade do Algarve, Portugal) por sua ajuda na preparação deste texto e suas sugestões, que melhoraram o trabalho, bem como aos Jovens Revisores por toda a sua difícil tarefa de revisão do artigo.

Referências

[1] Osborn, H. F. 1905. “Tyrannosaurus and Other Cretaceous carnivorous dinosaurs.” Bull. AMNH 21:259-65.

[2] Bates, K. T. e Falkingham, P. L. 2012. “Estimating maximum bite performance in Tyrannosaurus rex using multi-body dynamics.” Biol. Lett. 8:660 – 4. DOI: 10.1098/rsbl.2012.0056.

[3] Aber, W. 1999. “The teeth of the Tyrannosaurus.Sci. Am. 281:40 –1.

[4] Witmer, L. M. e Ridgely, R. C. 2009. “New insights into the brain, braincase, and ear region of tyrannosaurus (Dinosauria, Theropoda), with implications for sensory organization and behavior.” Anat. Rec. 292:1266 – 96. DOI: 10.1002/ar.20983.

[5] Smith, M. e Carpenter, K. 1990. “Forelimb biomechanics of Tyrannosaurus rex.J. Verteb. Paleontol. 10:43:A

[6] Horner, J. 1994. “Steak knives, beady eyes, and tiny little arms (a Portrait of T. rex as a scavenger)”. Paleontol. Soc. Spec. Publ. 7:157 – 64. DOI: 10.1017/S2475262200009497.

[7] Hone, D. W. E. e Watabe, M. 2010. “New information on scavenging and selective feeding behaviour of tyrannosaurids.” Acta Palaeontol. Pol. 55:627– 34. DOI: 10.4202/app.2009.0133.

[8] Carpenter, K. 1998. “Evidence of predatory behavior by carnivorous dinosaurs.” Gaia 15:135 – 44.

[9] De Palma, R. A., Burnham, D. A. , Martin, L. D., Rothschild, B. M. e Larson, P. L. 2013. “Physical evidence of predatory behavior in Tyrannosaurus rex.Proc. Natl. Acad. Sci. U.S.A. 110:12560 – 4. DOI: 10.1073/pnas.1216534110.

Citação

Wilkin, J. e Hone, D. (2020). “Was Tyrannosaurus rex a Ferocious Predator or a Wimp?” Front. Young Minds. 8:101. DOI: 10.3389/frym.2020.00101.

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