Ideias fundamentais Saúde Humana 4 de dezembro de 2024, 09:59 04/12/2024

Uma boa noite de sono fortalece sua imunidade!

Autores

Jovens revisores

Imagem de um menino dormindo em sua cama durante a noite, com a lua e estrelas visíveis pela janela. Acima dele, três balões ilustram atividades do corpo durante o sono: atividade cerebral, regeneração da pele e fortalecimento do sistema imunológico. 

Resumo

O sono é uma parte importante de um estilo de vida saudável. Desfrutar regularmente de um sono de boa qualidade beneficia o sistema imunológico e a defesa do corpo contra as infecções, em sua luta para combater as bactérias e os vírus que tentam nos deixar doentes. Além disso, ter um sono de qualidade no período de vacinação é importante para garantir que ela seja tão eficaz quanto possível em nossa proteção, e até por muito tempo depois. À noite, todos os germes que nos atacam durante o dia encontram as células do sistema imunológico, que são ativadas a fim de, se necessário, deter os invasores. Dormir bem contribui para aumentar a capacidade do sistema imunológico de nos defender quando somos infectados por vírus ou bactérias, mas também maximiza o poder das vacinas de nos proteger de doenças.

Introdução

Todo mundo fica doente de vez em quando, sobretudo nos meses mais frios do ano, quando muitas pessoas ao nosso redor tossem e espirram. No entanto, há muitas coisas que podemos fazer para ajudar nosso corpo a combater os germes que nos deixam doentes. Com frequência, ouvimos alguém dizer: “Coma alimentos saudáveis e tome suas vitaminas!” e “Não se esqueça do chapéu e do cachecol quando sair!”. Mas, de vez em quando, também costumamos ouvir: “Procure dormir bem!”. 

O sono pode nos manter saudáveis?

O sono pode realmente nos impedir de ficar doentes? As pesquisas parecem sugerir que sim. Vários estudos revelaram uma associação entre quantidade de sono e risco de doença. Num estudo de 2009, pediu-se às pessoas saudáveis que contassem aos pesquisadores sobre seus últimos catorze dias de sono, antes de serem isoladas num ambiente controlado e receberem gotas nasais que continham o vírus do resfriado comum. Os pesquisadores observaram os participantes durante os cinco dias seguintes, a fim de constatar se apresentavam sintomas da doença. E descobriram uma forte associação entre a quantidade de sono que os participantes tiveram antes da transmissão do vírus e o risco de adoecer por causa dele.

Aqueles que dormiram menos de sete horas na noite anterior à aplicação das gotas nasais tiveram quase três vezes mais probabilidade de adoecer do que aqueles que dormiram oito horas ou mais. Os pesquisadores também analisaram o efeito da eficiência do sono, que é uma forma de calcular quanto tempo uma pessoa dorme quando está na cama em comparação com estar na cama, mas sem dormir. Notaram que os participantes com menor eficiência do sono tinham cinco vezes mais probabilidade de desenvolver um resfriado do que os outros [1]. 

Essa descoberta foi repetida num estudo semelhante em que, ao invés de se basear apenas nos relatos das próprias pessoas sobre seu comportamento de sono, os pesquisadores acompanharam o sono dos participantes durante sete dias antes da experiência. O sono foi acompanhado por meio deactigrafia, técnica pela qual os participantes usam um tipo especial de relógio que registra quando estão dormindo e quando estão acordados.

Os pesquisadores descobriram que os participantes que dormiram pouco (menos de seis horas por noite) tiveram maior probabilidade de adoecer por causa do vírus em comparação com aqueles que dormiram mais de seis horas. Isso era verdadeiro independentemente de idade, raça, nível de renda, tabagismo e atividade física [2]. Portanto, parece que dormir bem ajuda o sistema imunológico do corpo a funcionar melhor, isto é, graças ao sono temos menos probabilidade de adoecer devido a patógenos como bactérias, vírus ou fungos que entram em nosso corpo. 

Há cerca de três anos, estávamos às voltas com a pandemia da COVID-19, causada por um novo coronavírus chamado SARS-CoV-2. Muitas pessoas foram infectadas por esse vírus, mas a gravidade dos sintomas variou entre elas, indo de nenhum sintoma a sintomas leves e a sintomas graves. Embora continuemos pesquisando as razões dessa resposta diversificada ao SARS-CoV-2, descobriu-se que o sono aumentava a capacidade do corpo de combater a infecção. Pessoas com baixa qualidade de sono um mês antes de serem infectadas pelo SARS-CoV-2 tinham mais probabilidade de ficar gravemente doentes e permanecer no hospital por mais tempo [3]. Além disso, entre os pacientes de COVID-19 que já estavam internados, aqueles que dormiam mal tinham maior probabilidade de piorar e ser transferidos para a unidade de terapia intensiva do que aqueles que dormiam bem [4].

Dormir faz a vacina funcionar melhor!

Além de nos ajudar a resistir às infecções, o sono contribui para fortalecer a imunidade que adquirimos após a vacinação, algo que muitas pessoas têm buscado ultimamente. Como mecanismo de defesa do corpo contra as infecções, parte da função do sistema imunológico é identificar os patógenos específicos que invadiram nossos corpos e produzir anticorpos contra eles. Os anticorpos são proteínas que podem aderir à superfície de um patógeno invasor ou se encaixar nele como uma chave numa fechadura, matando-o ou inativando-o. Os glóbulos brancos, células que trabalham em conjunto para criar anticorpos, são chamados de linfócitos.

Os linfócitos circulam no sangue e nos tecidos corporais até receber o aviso para entrar em ação quando um invasor está presente [5]. Resposta semelhante ocorre quando somos vacinados, só que o “invasor” nesse caso é a vacina. Depois de se familiarizar com a forma inofensiva do patógeno da vacina, os linfócitos ficam “treinados” e prontos para combater o patógeno real, caso ele venha a entrar no corpo. 

Então, como o sono faz com que as vacinas funcionem melhor? Um dos primeiros estudos a demonstrar que o sono desempenha um papel na imunidade após a vacinação investigou a vacina contra a hepatite A [6]. A hepatite A é um vírus que ataca o fígado e pode nos deixar doentes, por isso somos vacinados. As vacinas ajudam o sistema imunológico a se preparar para uma infecção futura entregando ao corpo uma versão enfraquecida do vírus, a fim de provocar uma resposta imune.

Nesse estudo, metade dos participantes dormiu na noite seguinte à vacinação, enquanto a outra metade ficou acordada a noite toda. Os pesquisadores mediram seus níveis de anticorpos quatro semanas depois, quando se esperava que esses níveis atingissem o ponto máximo. Aqueles que dormiram tinham duas vezes mais anticorpos que os outros. Mesmo um ano após a vacinação, os que dormiram na noite seguinte à vacina da hepatite A tiveram um número maior de anticorpos que os que não dormiram [7].

Um estudo mais recente monitorou o sono por meio de diários de sono, durante um período de treze dias antes e depois da vacinação com duas vacinas diferentes contra a gripe. Esse estudo descobriu que dormir duas noites após a vacinação contribuía muito para a produção de anticorpos num prazo de até quatro meses, embora isso se mostrasse verdade apenas para um tipo de vacina da gripe, e não para o outro [8]. Ainda não há nenhum estudo publicado sobre como o sono afeta a imunidade depois de a pessoa receber as vacinas para o SARS CoV-2. 

O tipo de sono também é importante!

O sistema imunológico é influenciado pela hora do dia. Por exemplo, o número de linfócitos em circulação no sangue atinge o ponto máximo à noite ou no início da noite e começa a diminuir até atingir o mínimo nas primeiras horas da manhã [5]. O número de linfócitos cai porque eles se afastam lentamente da circulação e entram nos gânglios linfáticos, onde podem encontrar quaisquer patógenos que tenham invadido o corpo no dia anterior [7]. Dormir à noite é importante porque, quando dormimos, são liberados certos produtos químicos que ajudam a iniciar a resposta imunológica e a combater ospatógenos, se eles estiverem presentes [5]. 

Embora ainda haja muito a ser descoberto sobre as interações entre o sono e o sistema imunológico, pesquisas sugerem que um tipo de sono denominadosono de ondas lentas(SOL) é importante nesse processo. Durante o SOL, as funções corporais e a atividade cerebral ficam mais lentas que durante a vigília. Quando as pessoas estão em SOL, seus corpos apresentam níveis muito baixos de cortisol, que é o hormônio do estresse. Estando por perto, o cortisol suprime a atividade do sistema imunológico; portanto, quando esse hormônio desce ao nível mais baixo, o sistema imunológico pode criar anticorpos e combater infecções com mais facilidade [5–7]. É importante notar que as pessoas têm mais SOL no início da noite que nas horas próximas ao amanhecer, quando seu sono tende a ser mais leve [7]. 

Dormir é a chave para ficar saudável!

Dormir bem todas as noites é tão importante quanto seguir uma dieta balanceada e praticar exercícios regularmente. Portanto, se você quer ser saudável, uma das melhores coisas que pode fazer para aumentar sua resistência às doenças é ter um sono de boa qualidade, regularmente. A necessidade de sono muda com a idade, e os mais jovens precisam dormir mais (Figura 1) [9]. Embora às vezes possa ser complicado ir para a cama e acordar na mesma hora todos os dias, especialmente à medida que você envelhece e fica mais ocupado, ter uma rotina regular para dormir e acordar é uma ótima maneira de fortalecer seu sistema imunológico para aproveitar melhor a saúde e todos os outros benefícios que o sono pode oferecer. 

Figura 1. A necessidade de sono varia com a idade. Quanto mais jovem uma pessoa é, maior é a necessidade de horas de sono (h). (Crédito da figura: [9].) 

Glossário

Eficiência do sono: Razão entre o tempo de sono e o tempo total gasto na cama. Quanto mais tempo a pessoa passar na cama dormindo, melhor será a qualidade de seu sono. 

Actigrafia: Método de medição do sono e do movimento nos humanos usando-se um pequeno dispositivo similar a um relógio. 

Sistema imunológico: Grupo de células e substâncias químicas que mantêm um organismo saudável. Sua função é detectar e combater germes e vírus que podem provocar doenças. 

Anticorpos: Proteínas do sangue que combatem os patógenos encaixando-se neles como uma chave em uma fechadura, protegendo assim as pessoas de doenças. 

Linfócitos: Células de glóbulos brancos produzidas na medula óssea. Há diferentes tipos de linfócitos, como as células T e B. Fazem parte do sistema imunológico. 

Patógenos: Organismos microscópicos (bactérias, vírus ou fungos) que penetram em nossos corpos e nos deixam doentes. 

Sono de ondas lentas: Tipo de sono profundo em que a atividade cerebral diminui e a temperatura do corpo cai. Os corpos das pessoas jovens crescem durante esse período, porque o hormônio do crescimento é secretado. 

Cortisol: Hormônio liberado no corpo quando somos ameaçados ou estamos estressados. Em pequenas quantidades é útil, mas se for em grandes quantidades pode ser prejudicial.  

Referências

[1] Cohen, S., Doyle, W. J., Alper, C. M., Janicki-Deverts, D. e Turner, R. B. 2009. “Sleep habits and susceptibility to the common cold.” Arch. Intern. Med.

169:62–7. DOI: 10.1001/archinternmed.2008.505.

[2] Prather, A. A., Janicki-Deverts, D., Hall, M. H. e Cohen, S. 2015. “Behaviorally assessed sleep and susceptibility to the common cold.” Sleep

38:1353–9. DOI: 10.5665/sleep.4968.

[3] Jiang, Z., Zhu, P., Wang, L., Hu, Y., Pang, M., Ma, S. et al. 2021. “Psychological distress and sleep quality of COVID-19 patients in Wuhan, a lockdown city as the epicenter of COVID-19.” J. Psychiatr. Res.136:595–602. DOI: 10.1016/j.psychires.2020.10.034.

[4] Zhang, J., Xu, D., Xie, B., Zhang, Y., Huang, H., Liu, H. et al. 2020. “Poor-sleep is associated with slow recovery from lymphopenia and an increased need for ICU care in hospitalized patients with COVID-19: a retrospective cohort study.” Brain Behav. Immun. 88:50–8. DOI: 10.1016/j.bbi.2020.05.075.

[5] ↑ Irwin, M. R. 2015. “Why sleep is important for health: a psychoneuroimmunology perspective.” Annu. Rev. Psychol. 66:143–72. DOI: 10.1146/annurev-psych-010213-115205.

[6] Lange, T., Perras, B., Fehm, H. L. e Born, J. 2003. “Sleep enhances the human antibody response to hepatitis A vaccination.” Psychosom. Med. 65:831–5. DOI: 10.1097/01.PSY.0000091382.61178.F1.

[7] Lange, T., Dimitrov, S., Bollinger, T., Diekelmann, S. e Born, J. “Sleep after vaccination boosts immunological memory.” J. Immunol. 187:283–90. DOI: 10.4049/jimmunol.1100015.

[8] Prather, A. A., Pressman, S. D., Miller, G. E. e Cohen, S. 2021. “Temporal links between self-reported sleep and antibody responses to the influenza vaccine.” Int. J. Behav. Med. 28:151–8. DOI: 10.1007/s12529-020-09879-4.

[9] Hirshkowitz, M., Whiton, K., Albert, S. M., Alessi, C., Bruni, O., DonCarlos, L. et al. 2015. “National Sleep Foundation’s sleep time duration recommendations: methodology and results summary.” Sleep Health 1:40–3. DOI: 10.1016/j.sleh.2014.12.010. 

Citação

Hadjimarkou, M. M. e Abdullayev, K. (2023). “A good night’s sleep strengthens your immunity!” Front. Young Minds. 11:1067201. DOI: 10.3389/frym.2023.1067201. 

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